Por: Emir Sader
Há dois anos surgiu o mais espetacular movimento de massas que o mundo
árabe já conheceu. Depois de amadurecer lentamente dentro de regimes
ditatoriais, os povos tunisino e egípcio saíram às ruas de maneira rebelde e
massiva, até conseguir derrubar duas ditaduras que tinham conseguido passar a
idéia da sua perpetuidade.
Movimentos de jovens laicos foram a novidade de massas mais importante,
quebrando a alternativa com que essas ditaduras tentavam perpetuar-se: ou elas
ou regimes fundamentalistas islâmicos.
Mas depois desse protagonismo espetacular dos povos tunisino e egípcio,
a primavera não conseguiu se estender ao conjunto da região. Ou melhor, suas
tentativas encontraram repressões duras e até mesmo de tropas estrangeiras, ou
desembocaram em bombardeios militares – como no caso da Líbia -, que
substituíram as manifestações de massa – ou em enfrentamentos militares de
parte a parte – como na Síria, entre atos terroristas e bombardeios militares.
O fim de um regime crucial para os Estados Unidos e o risco de que esse
precedente se estendesse por toda a região, fez com que as potências ocidentais
interviessem de forma direta e militar, levando à queda do regime de Kadafi e
desviando assim a natureza inicial da primavera árabe para outros objetivos. A
crise na Síria é uma derivação dessas manobras, em que os povos ficam afastados
da capacidade de intervenção e de dar inicio à construção de regimes
democráticos.
Ao mesmo tempo, eleições colocam novas autoridades nos governos - como
nos casos da Tunísia e do Egito – que ainda não expressam as novas forças
populares nesses países. Partidos que haviam sido tolerados durante as
ditaduras – especialmente muçulmanos – ganham as eleições, mesmo se não com
suas expressões mais radicais e governam sem ainda refletir as maiores
novidades da primavera árabe, particularmente suas formas laicas.
Para que sejam regimes transitórios, não deveriam, como no caso do
Egito, elaborar imediatamente uma nova Constituição, que tem o risco de impor
ao país um molde religioso conservador e bloquear um processo aberto de
construção da democracia nesses países.
Ao mesmo tempo, esses novos regimes nascentes não podem cair na tentação
de acordos com o FMI que, ao contrário de atender seus graves problemas
econômicos e sociais, os levará a recessões e a ainda mais graves crises
sociais.
São processos ainda abertos e tomara que permaneçam assim por um bom
tempo, para que as forças novas, jovens, laicas, possam se organizar melhor e
disputar a condução desses processos.
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